segunda-feira, 3 de junho de 2013

Os sentidos do Amor (2011)



Ao ver o filme lembrei-me de imediato do “Ensaio sobre a cegueira” o diretor usa os sentidos como meio para evidenciar uma série de questionamentos sobre a vida na sua dimensão de coletividade. No entanto os “Sentidos do Amor” não possui uma carga dramática tão forte quanto ao filme já citado, possivelmente por ter em seu desenvolvimento construção de uma relação amorosa entre Susan e Michael.

A história ocorre em um contexto de pandemia que está assolando toda a humanidade. De súbito, sem explicação os sentidos se dissipam. Não se trata de uma narrativa sobre zumbis ou qualquer outra coisa do tipo. O processo de perda dos sentidos é usado como metáfora para suscita problemas existências.

Os primeiros sentidos a serem perdidos são o olfato e posteriormente, o paladar. Está perda se dá após um episódio de uma tristeza profunda em função de uma perda. Sem nenhuma outra evidência que pudesse justificar o fato, até porque na verdade está não é está à intenção do diretor. O que está em jogo é: será que serei acometido por tal enfermidade? Ou melhor, será que serei acometido por uma perda tão profunda que ela irá destituir uma parte de mim?

Não há resposta para tal questão, uma vez que a dor é inerente a nossa existência em alguma medida, estaríamos fadados a assim a perder o olfato e paladar que dão “sabor” a vida. Sem eles tudo fica insosso. Perdemos parte de nossas lembranças que estão associadas à experiência do cheiro ou do gosto. 

Certa vez escutei uma definição – bem limitada e simplória – de que o sentimento é responsável por fornece colorido às lembranças, os sentidos são uma forma de atenuar e trazer a tona o material mnemônicos. Acho que é inevitável dizer que cada memória está associada a um nível de prazer ou desprazer.

Neste processo de perder o olfato e paladar as personagens são desafiadas a descobrir uma nova forma de resignificar o ato de se alimentar, não só é encarado com uma necessidade básica, como obrigatoriedade de ingerir carboidratos e lipídios, mas se faz necessário encontrar neste ato uma forma de apreciação que será direcionado então para o sentido da audição.  


Isto demonstra não apenas a nossa capacidade adaptativa e criativa, mas a necessidade de atribuir uma qualidade estética as coisas. A preocupação como com o que é se alimentar bem é substituída pelo prazer, a questão deixa de ser tão importante que vemos Susan e Michael se deliciando ao experimentar creme de barbear e sabonete em barra.

Outra questão interessante é promovida por Michael, que próximo a ser acometido pela doença tem como sintoma o ódio. Ele vocifera eloquentemente contra Susan pronunciando uma série de fatos que intencionalmente a magoa. O interessante disto é verificar o posicionamento que ele assume ao tentar se desculpar. Ele procura se isentar de sua responsabilidade culpando a doença por ter tomado aquela atitude. 

Penso em quantos subterfúgios escolhemos para não nos tornar responsáveis por nossas ações  e que são aceitos socialmente . E me pergunto  ainda como Michael não poderia ser responsável por tudo àquilo que anunciou sendo que conhecia que os dizeres teriam uma implicação negativa para sua companheira. É difícil negar que de alguma forma este ato de concretizou de um projeto consciente.

Enfim o filme levanta questionamentos sobre o sentido da vida coletivamente, demonstra a rede de significados que estruturam nossa vida e no fundo não tem sentido. As condutas que orientam nossas vidas são como os sentidos, nos orientam e posicionam no mundo, sem eles nos deparamos em profundo caos. 

domingo, 17 de março de 2013

A Viagem (2012)



A viagem apresenta uma série de histórias que tem seu desenrolar em tempos e lugares diferentes que até na metade do filme você não consegue imaginar do que se trata o enredo, o que é realmente muito bom!

É inevitável não lembrar de Matrix ao ver o filme, não só por ser orientado pelos mesmos diretores o que certamente favorece na manutenção de um certo estilo,  mas o que quero ressaltar em fazer a comparação é que ambos trazem a tona questões existenciais vividas na contemporaneidade.

O filme suscita uma série de questões, mas que dentre as seis histórias vou dissertar mais sobre a que se passa na Coreia do sul, no futuro.

A viagem é uma fantástica apresentação da insignificância humana! O avanço tecnológico nós faz acreditar que detemos um conhecimento infinito sobre a natureza e, por conseguinte o seu controle.
As servidoras do Papa Song são clones, “semi humanas” criadas com a finalidade de atender em  um restaurante Fast Food, sua vida útil se limita a realização desta tarefa.

Este grande feito de criar clones, ou melhor, máquinas apresenta o desejo que temos de ter controle sobre a vida, o que de fato sabemos não poder deter. A vida destes clones é delimitada é estabelecido o motivo da sua  existência (Atender a clientes), de que forma ela é vivida (Sua rotina, seus horários ,sua alimentação, suas roupas, enfim seus hábitos) e como será encerrada (a Exultação).


 É interessante pensar que as clones são seres sem existência, que vivem coma finalidade de atender as necessidades capitalista de um comércio, no entanto ainda se faz necessário conter o seu “lado humano”.

As clones perpassam sua existência com a concepção que poderão ascender pela a Exultação”,na verdade, nenhuma delas sabe exatamente o que isto significa, mas entendem que é a única possibilidade de ser deixar o restaurante, portanto está possibilidade e celebrada e vivida com grande entusiasmo quando acontece uma das servidores do Papa Song.

Com o decorrer da narrativa descobrimos  que se trata da  execução delas. Que é certamente também uma alusão à concepção cristã de vida pós a morte, do encontro com o paraíso após uma vida árdua é sem sentido. Que é uma tese que orienta e confere sentido a vida de muitas pessoas.

O filme mostra como estamos submetidos a uma lógica capitalista criamos por nós mesmo  para justificar nossa existência e que a vida em si mesmo é um niilismo. A forma como filme apresenta está dualidade é mostrar a tecnologia hipostasiada e a insignificância humana que legitima valores como estes que garantes a existência das servidoras no Papa Song.

É como se estivéssemos habituados em perceber que o mundo pode ser lido por teses científicas, como se a realidade pudesse ser descrita por uma serie de abstrações. Substituímos o mundo real por grandes teses matemáticas e não nós estranhamos com isto. Mas podemos fazê-lo é que viver de forma autêntica exige coragem de se transpor os limites.

É em uma longa reflexão de  Zachry , dentro do avião, consegue explorar estas possibilidades que vale a pena serem transcritas: “Ontem, eu acreditava que nunca faria o que fiz hoje. Essas forças que frequente reconstroem o tempo e espaço elas podem moldar e retocar o que se imagina que será de nos mesmos, com ela muito antes de nascermos e continua após nos morremos. Nossas vidas e nossas escolhas, como quantas trajetória são entendidas , momento por momento a cada ponto de interseção , cada encontro  sugerem uma nova possível direção”

O interessante é que não é simplesmente se dar conta disto, mas que isto implica em modificar todas as suas relações com o mundo e com os outros que é o que Sonmi-451 quer dizer quanto cita: “Ser é percebido é ser percebido pelo outro”, que tal possibilidade de ser livre só é possível quando compartilhada é onde surge a revolução que é lutar por uma vida autêntica e destituída de valores preestabelecidos.

Para Sinopse: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-143067/

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Laurence Anyways (2012)




O filme narra à história de Laurence um homem que aos 35 anos de idade decidi assumir sua transexualidade e viver a readequação corporal.

A princípio a transformações de Laurence é aceita por parte de sua família, pelos colegas e alunos no trabalho e pela sua namorada. Os pilares de sua existência ainda se fazem presentes.

No entanto rapidamente é posto uma série de empecilhos que irão levar a Laurence a ter que reconstruir toda a sua vida, devido à incapacidade daqueles que estão ao seu redor de aceitar/entender sua condição, como diz o próprio Laurence “isto não é uma revolta, mas sim uma revolução”.

Quando ele é demitido por meio da solicitação do conselho de pais, que usa como argumento o fato da transexualidade ser classifica no DSM IV como uma doença mental, Laurence faz referência ao livro de Nietzsche: Ecce Homo, que parece ser uma alusão à “transvalorização de todos os valores”, que se refere a impossibilidade da moral em dizer o que é verdadeiro, que o homem tem que ser capaz de superar o que posto por ela.

Outro momento que Laurence diz sobre a transexualidade é ao conversar com Fred, onde cita:

“Vivi assim por 35 anos e isto é um crime
Eu sou um criminoso
Roubando a vida de uma pessoa ...
A vida da mulher que nasceu para ser”

Aqui ele coloca a impossibilidade de se manter naquele corpo masculino que nunca o pertenceu, que ele não se identifica e não tem mais o interesse em dizer que lhe pertence.
 
É interessante como o diretor vai apresentando o desejo de Laurence pela transformação corporal, que se inicia com o olhar ao reparar o comportamento feminino de suas alunas ao arrumar o cabelo, por exemplo. É que tal desejo tem vazão quando ele colocar clipes em suas mãos para que assemelhem a unhas grandes.

Toda sua modificação corporal durante o filme é lenta e passa por vários retrocessos em função de seu relacionamento com Fred, sua namorada.

Laurence e Fred no início do filme tem um relacionamento não - convencional, existe uma liberdade entre ambos que é incomum e por vezes excessiva. Após a decisão de Laurence em assumir sua identidade transexual o relacionamento se desfaz, mesmo que Fred a princípio anuncia aceitar a modificação, mas que ela não consegue sustentar está posição. O que irá gerar uma série de conflito em ambos.

O filme é bem focado na relação amorosa entre os dois. Na árdua tentativa de se manterem vinculados á uma relacionamento que há tempos, como conclui Laurence no término do filme, já estava falido.

Merlau Ponty diz que o amor verdadeiro se finda quando um dos amantes se modifica. Não é que o autor negue que possa existir mudança, dentro de um relacionamento sempre mudamos, mas existem algumas modificações que são insustentáveis. E no caso de Laurence e Fred, o processo transexualizador que não foi suportado.

O fato de apresentar os conflitos da transexualidade, sobretudo dentro da relação amorosa, parece às vezes confundir as personagens.  A genitália parece definir a identidade de gênero de Laurence, por isto no filme ele oscila frequentemente entre a masculinidade e feminilidade. Dado a resistência de Fred em aceitar a feminilidade de Laurence.

O filme tem quase três horas de duração, mas é muito envolvente não somente pela temática, mas pelos recursos simbólicos usados por Xavier Doran. 

Para sinopse do filme:  http://www.imdb.com/title/tt1650048/

sábado, 12 de janeiro de 2013

Marina Abramović: Artista Presente (2012)



O documentário retrata os bastidores da apresentação de Marina Abramović no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoNA) em 2010, bem como  todo o percurso de sua apresentação comentado por ela e outras pessoas importantes de sua vida, como o seu ex- marido Ulay.

Eu desconheço as expressões artísticas, então fiquei impressionada com a ideia de ter o corpo como instrumento e simultaneamente objeto da arte. Pensar que o autor é agente de intervenção diante dos seus espectadores é fantástico, ainda mais quando se trata de uma intervenção especular, como proposta por Marina em sua apresentação no MoNA.

Desde Freud “o olhar do outro” é de suma importância na construção da subjetividade é que Lacan irá desenvolver posteriormente em toda sua teoria psicanalítica.

Para a psicanálise lacaniana, a relação como olhar é o que permite a construção da subjetividade. A criança percebe a si mesmo como fragmentada, quando olha para si percebe a suas mãos, os pés, partes dos braços e etc, mas não consegue se perceber unificada como uma totalidade composta por todas estas partes.

 A representação unificada do eu só será possível pelo intermédio do outro, do olhar do outro. Esta relação será denominada como especular, onde o eu não pode existir sem o simbólico, ou seja, a referência do outro. O interessante é que existe uma alienação sujeito no eu que o move a buscar o outro.

O olhar de Mariana Abramovic não tem aqui a função especular no sentido lacaniano, mas como descrito por alguns daqueles que experenciaram a performance é uma possibilidade de olhar para si mesmo, de ter o olhar não como construção da minha subjetividade, mas como possibilidade do encontro com o eu. 

Como explica Ulay, a performance de Marina tem a característica de apresentar a inatividade e o silêncio que permitem retirar os sujeitos do dinamismo o qual o homem pós moderno é submetido. O encontro do olhar de Mariana com aqueles que ali fazem parte da performance é fixo e anula toda a turbulência envolta de ambos, não há palavras ou gestos, apenas a comunicação com o olhar.